(1) SEGUNDA MOVIMENTAÇÃO DE PERSONAGENS
O sermão das Bem-Aventuranças [1]
Jesus
(Ficando em pé sobre o dispositivo cênico pivô de pedra) Bem-aventurados os humildes de espírito porque deles é o reino dos Céus! (Os seguidores aglomeram-se ao redor de Cristo) Felizes todos os que choram porque eles serão consolados (Os seguidores entreolham-se) Santificados os mansos porque herdarão a terra.
Coro de Homens Seguidores de Jesus
Aleluia!
Jesus
Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão a misericórdia.
Coro de Homens Seguidores de Jesus
Amém!
Jesus
Felizes todos os limpos de coração, porque verão à Deus. Santificados sejam os perseguidos por causa da justiça dos homens, porque deles é o Reino dos Céus!
Burburinho entre os seguidores. O coro de atores performa Sermão do Bom Ladrão.[2]
Coro de Atores
O ladrão que furta para comer, não vai nem leva ao inferno: os que não só vão, mas levam (...), são os ladrões de maior calibre e da mais alta esfera, os quais debaixo de mesmo nome e do mesmo predicamento distingue-se muito bem (...) Não são só ladrões (...) os que cortam bolsas, ou espreitam os que se vão banhar, para lhe colher a roupa; os ladrões que mais própria e dignamente merecem este título, são aqueles a quem os reis encomendam os exércitos e legiões, ou o governo das províncias, ou a adminstração das cidades, os quais já com manha, já com força, roubam e despojam os povos. Outros ladrões roubam um homem, estes roubam cidades e reinos: os outros furtam debaixo do seu risco, estes sem temor nem perigo: os outros, quando furtam, são enforcados, estes furtam e enforcam!
Jesus
Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão saciados.
O coro performa Monólogo ao pé do ouvido/Bantitismo por uma questão de classe.[3]
Coro de Atores
Modernizar o passado
É uma evolução musical
Cadê as notas que estavam aqui
Não preciso delas!
Basta deixar tudo soando bem aos ouvidos
O medo dá origem ao mal
O homem coletivo sente a necessidade de lutar
O orgulho, a arrogância, a glória
Enche a imaginação de domínio
São demônios os que destroem o poder bravio da humanidade
Viva Zapata! Viva Sandino! Antônio Conselheiro
Todos os panteras negras
Lampião sua imagem e semelhança
Eu tenho certeza eles também cantaram um dia:
Há um tempo atrás se falava em bandidos
Há um tempo atrás se falava em solução
Há um tempo atrás se falava em progresso
Há um tempo atrás que eu via televisão
Galeguinho do choque não tinha medo, não tinha
Não tinha medo da perna cabeluda
Biu do olho verde fazia sexo, fazia
Fazia sexo com o seu alicate
Oi sobe morro, ladeira, córrego, beco, favela
A polícia atrás deles e eles no rabo dela
Acontece hoje
Acontecia no sertão
Quando um bando de macaco perseguia lampião
E o que ele falava outros hoje ainda falam
“Eu carrego comigo coragem, dinheiro e bala”
Em cada morro uma história diferente
Que a polícia mata gente inocente
E quem era inocente hoje já virou bandido
Para poder comer um pedaço de pão todo fodido
Banditismo por pura maldade
Banditismo por necessidade
Banditismo por uma questão de classe!
Rumoroso tumulto no coro seguido de um longo silêncio. Jesus caminha sozinho pela praia; colhe um graveto no chão e passa a rabiscar na areia com ele.
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