domingo, 30 de outubro de 2011

O USO DO TEATRO COMO RECURSO DIDÁTICO NA ESCOLARIZAÇÃO


Tentarei tornar mais nítido, neste texto, o equacionamento da problemática da nomenclatura para referir usos do Teatro com objetivos explicitamente educacionais.

Ricardo Ottoni


Faço isso buscando oferecer resposta a perguntas que me são dirigidas quando estou conectado a redes sociais das quais faço parte. Não se trata aqui de adotar o “modelo” impessoal, antidialógico, intolerante e pedante do serviço FAQ (Frequent Asked Questions = Perguntas Mais Frequentes) - “naturalizado” em sites movidos pela “urgência” e “pragmatismo” cujo objetivo é a “domesticação” e “uniformização” dissimulada do pensamento.

Não deve existir resposta rápida, “objetiva” ou “única” para solucionar o problema da taxonomia “oficial” para referir práticas educacionais ou educativas que reinvindicam o direito inalienável dos educadores de recorrerem ao poder da comunicação através do Teatro (da Linguagem Teatral) para a exposição didática de conteúdos disciplinares.

No livro Metodologia do Ensino de Teatro procuro expor o “pega-varetas” aberto sobre o tabuleiro do rigor acadêmico quando se quer abordar a dimensão educativa das Artes Cênicas: - Como remover as consignas-varetas, uma a uma, sem prejuízo do deslocamento das outras? Complicado. Sem dúvida, esta é uma ocupação que exige atenção, cuidado e tempo para finalizar a tarefa.

No capítulo primeiro do livro acima mencionado, intitulado Princípios pedagógicos do Teatro, ao longo dos subtítulos Teatro e currículo escolar e  Abordagens pedagógicas do Teatro na Educação (páginas 26 a 30), consegue-se ter uma tímida aproximação do problema. Mas meu ponto de vista pessoal ali não “esgota” a discussão, expessa, das questões a serem equacionadas.

Vou tomar a pergunta de um acadêmico que nutria dúvida quanto ao modo de referir sua proposta de intervenção pedagógica no sentido de promover a apropriação da explicação científica de fenômenos observados em reações químicas. Pelo que entendi ele buscava apresentar um texto dramático (Teatro escrito) que pudesse ser encenado (Texto apresentado cenicamente, corporalmente, com tomada de papéis).

Sua dificuldade era caracterizar sua proposta adequadamente de modo a não ocorrer incompreensão do que pretendia desenvolver com objetivos instrucionais valendo-se do Teatro como recurso didático para o ensino de conceitos científicos de Química.

Dada as limitações das interações síncronas pela escrita via Rede (tempo de digitação, sacrifício da pontuação, grafia não ortodoxa de palavras etc) julguei oportuno utilizar OBSERVE para oferecer-lhe uma opinião menos apressadamente expressa em palavras.

No meu entendimento, expresso no livro, primeiramente é preciso entender que as dimensões INSTRUMENTALISTA (Teatro a serviço de conteúdos disciplinares ou “extrateatrais”) e ESSENCIALISTA (O que o Teatro ensina sobre as possibilidades “estéticas” do uso e manejo consciente da Linguagem Cênica e convenções teatrais) não se encontram assepticamente “isoladas”; que suas fronteiras apresentam-se “borradas” - como ocorre nos objetos representados visualmente recorrendo a pixels em suportes imateriais (digitalizados).

Deste ponto de vista, todo uso instrumental do Teatro revela uma opção do educador, consciente ou não, por um determinado tipo de “estética” cênica. Então uma encenação “realista-naturalista” de um texto dramático que busque, por exemplo, tornar menos “indigestos” densos conceitos matemáticos, elege necessariamente um modo de entender e conceber a atividade teatral como “ilusionista”, quer dizer, apela para que o observador/público “acredite” como verossímil e “real” uma realidade fundada na convenção (as “dramatizações” típicas dos programas de telecurso são muito úteis para exemplificar o que quero dizer aqui).

A rigor, a referência a este tipo de expediente didático, sem receio de possíveis eventuais objeções, pode ser consignado como “peça pedagógica” (Para ser lida, dita ou encenada). Em socorro do uso desta consigna pode-se recorrer ao amparo da citação do verbete “Teatro didático” redigido por Patrice Pavis, autoridade em estudos teatrais, localizado em seu Dicionário de Teatro, editado pela Perspectiva em 2001, às páginas 386-387.

Agradeço a todos os que me formularam questionamentos síncronos online e que, ao enunciá-los, colocaram em movimento o blog OBSERVE – ambiente virtual que não se confunde nem se propõe competir com agências de notíciamento de curiosidades ou efemérides da vida social, artística, cultural e ou privada de pessoas e grupos.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

O brincar como atividade organizadora das condutas do sujeito na infância

Ricardo Ottoni
A “periodização” (seriação) da escolarização se apresenta como planificação da atividade organizadora (dos modos de ser e pensar) das pessoas. A atividade coletivamente concebida como adequada ao período da ontogênese descrito como infância é o BRINCAR.
O brincar desencadeia  processos de culturalização (transformação) do psiquismo durante a infância e deve ser assegurado para garantir-se o aprender a ser Criança. Ser Criança é um lugar ou situação social que revela a posição do sujeito frente aos impedimentos de sua inserção produtiva  no mundo do trabalho. 

Brinquedoteca de organização para educação infantil da rede municipal de SP




Brincar é um modo de adiar ou “sublimar” a satisfação dos desejos de inclusão precoce do ser organicamente em crescimento no mundo das práticas relacionais entre sujeitos que possuem organismos com ciclo de crescimento biológico consolidado. Fundamental para alívio emocional em razão da mordaça imposta às vozes infantis pela chancela cultural. Neste sentido, o único canal de comunicação concedido aos enunciados infantis, conscientes ou não: a oportunidade para a imaginação por em movimento modos de ser, sentir e pensar.

“O teatro das crianças, quando pretende reproduzir diretamente as formas do teatro adulto, constitui uma ocupação pouco recomendável para crianças. Começar com um texto literário, memorizar palavras estranhas como fazem os atores profissionais, palavras que nem sempre correspondem à compreensão e aos sentimentos das crianças, interrompe a criação infantil e converte as crianças em repetidores de frases de outros obrigados pelo roteiro. Por isso se aproximam mais da compreensão infantil as obras compostas pelas próprias crianças ou improvisadas por elas no curso de sua criação.(...) Estas obras resultam sem dúvida mais imperfeitas e menos literárias que as preparadas e escritas por autores adultos, mas possuem a enorme vantagem de terem sido criadas pelas próprias crianças. Não se deve esquecer que a lei básica da criação artística infantil consiste em que seu valor não reside no resultado, no produto da criação, mas no processo de criação em si. (Destaques meus).


VYGOTSKY, L. S. La imaginación y el arte en la infancia. Madrid: Akal, 1982, p.46.  (Tradução livre minha)