sábado, 25 de dezembro de 2010

ERA UMA VEZ A PSICOLOGIA CIENTÍFICA... (2)

Na INTRODUÇÃO os autores deixam claro que seu objetivo com o livro é compartilhar uma atitude pós-moderna radical de confronto à Psicologia Ocidental “oficial” (hegemônica), despindo-a em público. Anunciam em alto e bom som, mas com dignidade, a falência dos axiomas “moribundos”, da crença “objetivista” e da pretensão “científica” desta fascinante área do conhecimento humano.

Ali definem-se como praticantes da Teoria Histórico-Cultural da Atividade-CHAT (Cultural-Historical Activity Theory) revelando sem pudor sua adesão à escola socioculturalista norte-americana; e justificam sua opção por acreditarem ser inseparável o entendimento do psiquismo humano dos modos de organização histórica da vida social.

Ao longo de doze páginas conseguem condensar os fundamentos da crítica feroz que fazem à tentativa comovente da Psicologia de aderir ao cientificismo - que impregna todo o pensamento modernista - mas não sem propor algo para ocupar o vácuo deixado pelos escombros da Modernidade.

A introdução divide-se por sua vez em duas partes intituladas respectivamente Filosofia, Ciência e Psicologia [Philosophy, Science and Psychology] e A Atividade fala mais alto do que as Narrativas [Activity Speaks Louder than Stories].

Os autores, na primeira parte, basicamente apresentam seu “DNA” epistemológico, emblematizado pelo diálogo franco com os pensamentos de Vigotskii e Wittgenstein - o que lhes permitiu formular uma abordagem performático-cultural para entender o psiquismo humano.

Deixam claro que o psiquismo tipicamente humano só pode ser genuinamente compreendido enquanto atividade criadora de novas formas de vida e que portanto só uma abordagem performático-cultural, não interpretativa, poderia dar conta de algo que é necessariamente relacional e atual (performático ou processual), ou seja, uma Psicologia Acientífica.

A rigor, os autores não propõe uma Psicologia propriamente dita mas um jogo qualitativamente novo que possibilite libertar definitivamente as subjetividades dos dolorosos processos de coisificação.[“indeed, not a psychology at all but a qualitatively new kind of play, a continuous uncommodified performance of subjectivity” (p.2)]

Esclarecem que o livro é uma continuação do seu Lev Vygotsky – cientista revolucionário [NEWMAN, F. & HOLZMAN, 2002 (Loyola)], ampliando e aprofundando a discussão do pensamento vigotskiano no qual se sustenta a Teoria Histórico-Cultural da Atividade/CHAT.

Informam que pretendem demonstrar como aspectos pós-modernos originalmente presentes em sua idéia-mãe permitem caracterizar a produção intelectual vigotskiana como sólida ponte entre a sufocante psicologia pseudocientífica modernista e as promissoras possibilidades que se apresentam a partir de sua atualização ou “pós-modernização”.

Os autores esclarecem que o pensamento vigostkiano, somado à filosofia de Wittgenstein emblematizada pelos jogos de linguagem [Language-games], lhes permitem confrontar  a autoridade avaliadora da Psicologia Científica e revelar como, ao ambicionar o status de ciência, a Psicologia se apresentou à Modernidade como a “voz da razão”; que farão isso examinando criticamente a tradição filosófica inaugurada pela Antiguidade Clássica ocidental, na primeira parte do livro, encorajados pelo amparo da rede de concepções diagnósticas conectadas ao pós-modernismo.

Em seguida apresentam os conteúdos a serem trabalhados na segunda parte do livro, anunciando que focalizarão de modo privilegiado o relevante papel da “contação de histórias” [storytelling] e das narrativas como ferramentas úteis para desvelar os vieses metodológicos e ideológicos das Ciências Sociais na Modernidade.

Explicam que não pretendem abrir mão de uma perspectiva crítica na abordagem à vertente narrativista ou interpretativista, embora reconheçam sua contribuição para a colaboração do conhecimento a respeito do funcionamento do psiquismo humano. Para eles, a postura narrativa ainda se encontra presa à noção de verdade por ser a interpretação, em última instância, uma proposição de verdade sob determinadas circunstâncias - o que equivale dizer que em algum sentido algo acaba sendo tomado por verdade. [ “An interpretation is a proposition that is true under certain circumstances; that is, given a certain interpretation, one takes something to be true.” (p.6)]
Anunciam a atividade como “unidade de análise” do psiquismo tipicamente humano e princípio criador emergente de novas formas de vida autoreferenciais e autoreflexivas nas quais sócio-historicamente o entendimento encontra-se inseparável do desenvolvimento.

Deixam claro que, para eles, as narrativas não reificadas (não naturalizadas), ou seja, o convite ao engajamento voluntário na colaboração relacional e continuada de novas formas de vida social é que obstinadamente advogam ao formularem e proporem a terapia social da performance.

Por fim, concluem a introdução caracterizando, sem falsa modéstia, Psicologia Acientífica e seus outros trabalhos publicados como integrantes da tradição revolucionária pós-moderna, da qual se orgulham.



NOTA DE RODAPÉ
Para maiores esclarecimentos à respeito da terapia social da performance sugere-se consultar:

HOLZMAN, L. & MENDEZ, Rafael (2003) Psychological Investigations – a clinical guide to social therapy. New York-Hove: Brunner-Routledge.

JAPIASSU, Ricardo (2010) A terapia social da performance de Fred Newman Metodologia do ensino de teatro/9ª Ed. Campinas: Papirus,Cap.1, p.55-62.


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