O elo ausente na trama do desenvolvimento regional
Governador Jacques Wagner Propositor do Edital para construção da Ponte |
Notícia sobre publicação do edital da ponte
Na qualidade de cidadão natural de Salvador e munícipe de Vera Cruz/Ba vou me permitir equacionar algumas poucas questões trazidas pela tardia e desassombrada decisão das macropolíticas oficiais do Governo do Estado da Bahia: a construção da ponte sobre a Baía de Todos-os-Santos interligando Salvador à ilha de Itaparica, ao Recôncavo e ao Baixo-Sul baiano.
Sem a pretensão de ser “dono da verdade” nem de elaborar um parecer de especialista em manejo e/ou mapeamento ecológico-econômico da Baía de Todos os Santos vou abordar apenas alguns aspectos do impacto da construção da ponte Salvador(a)Itaparica na “aceleração” ou “apressamento” do processo de crescimento econômico, social e cultural da Bahia, e do Brasil, externando algumas preocupações com a repercussão deste empreendimento sobre o meio ambiente e socioeconômico na perspectiva crítica mas cívica dos direitos e deveres da cidadania em defesa da “sustentabilidade” do desenvolvimento regional.
Slideshow de fotos do projeto da ponte
Considerando a promessa de construção da ponte Salvador(a)Itaparica não apenas uma “bravata” eleitoreira para tomada de poder para a gestão do estado da Bahia, penso ser necessário opinar sobre este megaempreendimento – que fascina, assusta e afeta todos nós. Devo começar destacando pontos “positivos” da iniciativa - que implicarão vários giros vertiginosos em espiral ascendente criando oportunidades concretas de trabalho, emprego, crescimento econômico e cultural do/no estado:
(1) Beneficio e redução dos custos enredados na logística necessária ao escoamento da produção pesqueira e agro-industrial de todo o Recôncavo e Baixo-Sul baiano e do fluxo de produtos do parque industrial e petroquímico oriundos da Região Metropolitana de Salvador;
(2) Incontáveis oportunidades de bens e serviços relacionados à construção civil, ao comércio em geral e ao turismo em particular bem como atração de investimentos imobiliários nas áreas liberadas para urbanização que serão provavelmente integradas à Região Metropolitana de Salvador - sem prejuízo das APAs que circunscrevem reservas indígenas, quilombolas, ambientalistas, oceanográficas, de mata atlântica, manguezais, corais, fauna e flora nativas, estâncias hidrominerais da ilha de Itaparica, Recôncavo e Baixo-Sul baiano;
(3) Criação de condições otimizadas para implantação de campi avançados (cidades universitárias) de organizações particulares e sobretudo públicas (federais e estaduais) de educação superior e técnica na ilha de Itaparica particularmente das vocacionadas para as ciências médicas, da natureza e da terra, humanas, esporte, comunicações e artes;
(4) Possibilidade de requalificação do aeroclube (Clube de paraquedismo de Vera Cruz) convertendo-o em campo de pouso de apoio ao aeroporto internacional Luiz Eduardo Magalhães de Salvador;
(5) Atração de investimentos para a implantação de uma rede de assistência à saúde através de centros destinados à diversas terapias para o corpo e a mente paralelamente ao incremento à produção da indústria do esporte-lazer-turismo e da circulação de bens artísticos e culturais;
(6) Duplicação e privatização da Rodovia BA 001 no trecho entre a “ponte do funil” até o pedágio que dará acesso à travessia no sentido Itaparica-Salvador; criação de estações de transbordo para ônibus interligando localidades da ilha a terminais urbanos de Salvador permitindo transporte coletivo ágil e de grande capacidade para atender à demanda de movimentação da população particularmente de trabalhadores, com rápida ligação entre Recôncavo e Baixo-Sul à capital do estado.
Elencados alguns pontos “positivos” ou “benefícios” será útil desdobrá-los em seus contrários “negativos” sinalizando os “custos” humanos e sócio-ambientais para que sejam pensadas desde já políticas compensatórias e reparadoras dos prejuízos ecológicos e humanos gerados pelo empreendimento e seu “rápido” ciclo de crescimento - para que este venha a se tornar mais longo em sua duração de modo a converter-se em desenvolvimento cultural sustentável:
(1) A ponte atrairá um forte aporte de capital e com isso agilizará o processo atualmente em curso de concentração de terras e renda nos municípios localizados na ilha de Itaparica, Recôncavo e Baixo Sul baiano;
(2) A maioria da população insular, do Recôncavo e Baixo-Sul baiano possui baixíssima ou nenhuma escolaridade e sobrevive da pesca artesanal, da coleta de mariscos e de uma tímida agricultura familiar pulverizada em pequenas glebas que serão “violentamente” substituídas por grandes propriedades necessárias à instalação da infra-estrutura solicitada pelo empreendimento cujos PODEROSOS INVESTIDORES OBTERÃO PREVISIVELMENTE APOIO DO GOVERNO DO ESTADO;
(3) Os pequenos proprietários, agricultores familiares, comerciantes, pescadores e coletores de marisco, por não possuírem a qualificação profissional nem os meios de produção exigidos pela COMPETITIVIDADE do “novo” mercado de trabalho serão “convidados” ao êxodo e devem se concentrar em bolsões de pobreza periféricos às emergentes concentrações urbanas na ilha, Recôncavo, Baixo-Sul e região metropolitana de Salvador;
(4) Ocorrerá um significativo AUMENTO DA POPULAÇÃO RESIDENTE NA ILHA com ocupação laboral na região metropolitana de Salvador bem como a chegada de “novos baianos” (migrantes horizontais) atraídos pela promessa de oportunidades de trabalho, emprego e renda que produzirão mais lixo, mais conflitos sociais e culturais;
(5) A PRODUÇÃO DE LIXO, poluição, prostituição, abuso de drogas, trânsito de pedestres, tráfego de veículos, ócio, delitos, criminalidade e violência urbana serão incrementados o que desencadeará a demanda crescente por segurança pública, serviços de assistência à saúde física e mental, amparo social, educação continuada (escolarização) e transporte público de massa;
(6) A construção da ponte exigirá INVESTIMENTOS MUNICIPAIS URGENTES em transporte público de massa (ônibus com linhas e horários regulares interligando as várias localidades da ilha à sede do Poder Municipal em Mar Grande e aos terminais rodoviários para o acesso à travessia marítima pela ponte e sistema ferry-boat em Bom Despacho); iluminação pública ao longo da rodovia BA 001 e nas ruas perpendiculares que dão acesso aos vários loteamentos da ilha; serviços para coleta de lixo; rede de saneamento básico (esgotamento sanitário), pavimentação, sinalização padronizada de ruas, praças e numeração seqüenciada de imóveis (ordenamento do solo urbano); construção de plataformas e passarelas de embarque/desembarque no terminal aquaviário de Mar Grande com infraestrutura portuária que permita o fluxo regular entre a ilha e Salvador nas ocasiões de ocorrência de maré baixa (ausência de um acesso flutuante até o ponto onde se localiza o farol na fenda entre os arrecifes); recebimento residêncial de correspondência enviada por correio regular entre outras.
Destacadas aqui as contradições acima emerge a necessidade de ser formulada uma síntese para resolvê-las. Não se tem a pretensão com este texto de encontrar a resposta correta, mas antes destacar a importância da urgente busca de solução do problema. Os “custos” humanos e ambientais do empreendimento solicitarão várias políticas públicas municipais e do Governo estadual em PARCERIA COM A INICIATIVA PRIVADA de natureza não assistencialista e compensatória para manter o equilíbrio ecológico, socioeconômico e educativo tendo em vista a melhoria da qualidade de vida das populações “nativas” e de migrantes não-qualificados bem como sua “inclusão” produtiva no “novo” mercado de trabalho que a ponte incrementará. É preciso começar a pensar nisso desde já! Forjar o elo ausente na trama do desenvolvimento regional de modo indefectível pressupõe (co)laborar uma SÍNTESE para “resolver” os vários conflitos típicos dos processos de transformação cultural.
Vera Cruz/BA, 27 de março de 2010.
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