Johnny Weir coroado em Vancourver Olimpidadas de Inverno 2010 - Patinação Artística Coliseu |
Não dá pra ficar de fora da discussão desencadeada pelo forte “baque” na recepção e apreciação da trilha sonora do Carnaval 2010 de Salvador com a ousadia do novíssimo pagode baiano na música Lobo Mau.
Críticas provenientes do consevadorismo moralizante à irreverência das expressões espetaculares durante os festejos de Momo são antigas e revelam a ausência de disposição de grupos no poder para pensar desapaixonadamente a representação cênica carnavalizada da vida social através dos tempos.
A polêmica em torno da letra da música e do gestual erotizado lúdica e espontaneamente sucitado por seu ritmo traduz o recrudescimento da intolerância para com a permissividade e a liberdade de expressão que caracteriza a pletora de formas irreverentes da comunicação cênica (corporal) durante o Carnaval. Os conservadores vociferam que a letra e a movimentação do corpo no pagode Lobo Mau é uma apologia à pedofilia e à prática sexual genital.
Muitos - não ingenuamente - querem nos fazer crer que o tratamento artístico de temas polêmicos como assassinatos, estupros, sexismo, abusos de menores e de drogas exorta as pessoas à essas práticas condenáveis. Insistem em não aceitar que as relações entre as Artes e a Realidade Social são complexas, que a existência do signo artístico difere radicalmente da existência da vida em si.
Arautos do moralismo intolerante optam deliberadamente por desconhecer os fundamentos estéticos da atividade artística não por falta de instrução mas por se sentirem ameaçados pelo o que a (re)criação espetacular lúdica do ser humano pode revelar de terrível sobre o íntimo da sua natureza “bruta” – algo exaustivamente banalizado por documentários do jornalismo dedicado à crônica policial.
Parabéns Ivete Sangalo pela coragem de encarnar o verdadeiro espírito momesco e defender o discurso irreverente dos “brincantes” no pagode do povão durante o carnaval de Salvador.
Alternando-se na atuação erotizada do papel do ousado “Lobo” no Festival de Verão 2010 e da recatada e prudente “Chapeuzinho” no Campo Grande Ivete brilhantemente, diante das câmeras, no palco “oficial” do Carnaval 2010, promoveu uma “resposta” corajosa ao conservadorismo e pôs fim aos seus ecos na mídia através do iluminador diálogo líteromusical entre Lobo Mau (pagode do Baque) e Lobo Bobo (bossa nova de João Gilberto).
De parabéns também a excelência dos comentários da equipe de jovens comunicadores da TV Aratu (Carla Araújo e Leonardo Sampaio) que honestamente, de modo descontraído e em linguagem cotidiana acessível a todos, no domingo dia 14 à noite, aproveitando a falta de movimento na passarela dos trios da Barra, contribuíram muito para iluminar a mente dos telespectadores e foliões entorpecidos pelo merchandising que desfilava indefectível e intermitente nos outdoors eletrônicos dos palcos sobre rodas ao som dos mais variados ritmos carnavalescos.
Os palcos móveis que caracterizam o carnaval baiano eram já utilizados em cortejos sacros e profanos desde o fim da Idade Média sobretudo na Inglaterra e Espanha. A contribuição soteropolitana é a amplificação do som sobre corsos (desfile de carruagens e carros) que evolui paralelamente a adequação de veículos de grande porte às exigências contemporâneas da engenharia teatral e do mercantilismo transnacional.
É muito bonito constatar que a teatralidade do carnaval tem sido paulatinamente resgatada por cantantes, bailarinos e músicos através do uso cada vez mais freqüente de figurinos e cenários sob os trios (palcos móveis). Mais que mera função “decorativa” as fantasias tem sido a sustentação para uma atuação teatral lúdica dos cantantes nos trios. Seja através de pantomimas e coreografias de dançarinos exaustivamente ensaiados que dão sustentação a sua prática artística ou a partir da teatralização de sua performance de modo improvisado.
A linguagem teatral invadiu definitivamente os trios e isso redimensiona e amplifica a atuação dos cantores que ousam cada vez mais incorporar, mesclando de modo lúdico, elementos épicos (narrativos), líricos e dramáticos.
Penso que deveria ser definitivamente abolido todo tipo de julgamento para decidir qual música/bloco/escola de samba/fantasia/cantor é o “melhor.” Esse tipo de hierquiarização/mensuração da performance e desempenho das pessoas em atividade lúdica, artística, profissional, escolar ou esportiva é prejudicial ao espírito congregacionista, ao prazer da celebração do estar junto e apenas caracteriza um momento de sua atuação.
Nas olimpíadas de inverno do Canadá por exemplo, fiquei horrorizado com a pontuação atribuída pelos “juízes” à dupla alemã de patinação artística Maylin Hausch e Daniel Wende que performaram brilhantemente Alexandre – O Grande. A queda não intencional de Maylin e toda a subsequente movimentação cênica do casal que se seguiu ao “acidente” em seu roteiro técnico comentando-o e aproveitando-o autocriticamente ao longo de sua atuação revelou seu elevado e refinadíssimo nível de teatralidade (intencionalidade da comunicação não verbal) por apresentarem uma sofisticada relação de cumplicidade com a platéia sem renunciarem no entanto ao enredo previamente ensaiado.
Foram aplaudidos seguidamente de pé por alguns segundos após sua brilhante apresentação de sentidos sobrepostos.
Fotos da performance de Maylin e Daniel
Quando a teatralidade consegue êxito paralelamente à excelência da execução de uma técnica a magia da Arte acontece. É o que ocorre com o genuíno futebol brasileiro destacando-o do jogo bruto praticado por outros coletivos de atletas.
Causa revolta quando a teatralidade é desprezada em nome do rigor técnico ou de critérios políticos inconfessáveis mascarados sob a consigna de “subjetivos” como o que lamentavelmente ocorreu também no Pacific Colliseum em resposta à provocante, irreverente mas tecnicamente impecável (arrasante) atuação do norteamericano Johnny Weir que foi hostilizada pelos juízes atribuindo-lhe pontuação baixa como punição à sua atitude abertamente gay no palco de gelo – que mereceu aplausos eufóricos da platéia.
Fotos de Johnny Weir
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Ao silêncio das boas mocinhas e mocinhos “educados” (artistas, jornalistas, críticos e anônimos), amordaçados pelo medo da teatralidade lúdica fica o apelo para que abandonem suas máscaras e mostrem sua verdadeira face sem pudor dando a língua em público! Ser terra de “índio” não é nenhum demérito. Deixemos de hipocrisia porque como já disseram Daniela Mercury e Marcelo Quitanilha em Dona desse lugar “Muito antes do Brasil ser Vera Cruz os primeiros habitantes por aqui andavam nus”, inclusive no Rio Grande do Sul dos Guaranis e de Renato Gaúcho.
Essa febre de “recato” hipócrita colonialista é nociva ao Carnaval dos trópicos. Ainda bem que a nudez masculina e feminina (ao menos do tórax) insiste em desfilar nas passarelas da folia. Parabéns para o parangolé dos “selvagens”! Viva Jonhnny Weir!
Talvez com a implosão da FONTE NOVA e construção da ARENA FONTE NOVA multimídia seja possível assistir shows de patinação artística e curtir a inesquecível performance provocativa assumidamente gay de Jonhnny Weir e da impecável dupla germânica Hausch-Wande no belíssimo programa Alexandre, o grande apresentados em Vancourver. Saudade dos espetáculos Hollyday on Ice no Balbininho...
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