Sabe-se que o espetáculo Apareceu a Margarida dirigido por Manoel Lopes Pontes e atuado por Yumara Rodrigues foi o primeiro empreendimento cênico soteropolitano a alcançar projeção nacional e internacional nos saudosos anos 70. Não se pode deixar de lembrar também o retumbante sucesso de público e bilheteria de A Bofetada, texto de Miguel Falabela protagonizado pela Companhia Baiana de Patifaria sob a regência de Guerreiro na década de 80. Mas, a bem da verdade, uma tríade baiana vitoriosa com projeção nacional enredando dramaturgia, encenação e atuação só foi de fato concretizada com a realização de OFICINA CONDENSADA no início dos 90.
O que há de “novo” na segunda edição de OFICINA CONDENSADA no século XXI? Tudo de novo: o decalque cuidadoso do argumento de Aninha sobrepondo-se às circunstâncias correntes do momento social, político e econômico do Brasil, da Bahia e do mundo que vivifica e atualiza a encenação; a problematização oportuna e bem-vinda, com humor, do desejo feminino e sua intolerável excisão por parte do pensamento autoritário-heteronormativo-falocêntrico transnacionalizado - tipicamente modernista - que ainda assombra e ameaça silenciar o clamor das mulheres, eunucos e oprimidos na pós-modernidade.
Sob o aspecto cênico o espetáculo revela domínio magistral das convenções teatrais para o palco italiano por parte de Guerreiro oferecendo um produto com excelente ritmo, composição, equilíbrio e espaço para atuação improvisada: tudo, absolutamente tudo funciona satisfatoriamente.
Agrada-me particularmente os momentos que conclamam o espectador à reflexão através do apelo dramático comovente e convincente da atuação magistral de Rita, rompendo intencionalmente a euforia contagiante da empatia criada com a performance hilária da professora Ivone Brandão.
Nestas exortações à afetividade estética do público revela-se a sofisticada partitura cênica cuidadosamente regida por Guerreiro e valorizada pela gestualidade primorosamente esculpida pela atuação extraordinária e experiente de Assemany: um luxo. Um casamento perfeito entre técnica e intuição.
Rita Assemany em cena de A casa da Minha Alma |
A crítica do espetáculo ao paradigma pedagógico hegemônico (famigerada tradição expositiva “animada” típica dos cursinhos pré-vestibulares) até poderia ser menos sutil e mais enfática mas a elegância da encenação de Guerreiro reside em não declinar para a vulgaridade na abordagem de complexas implicações educacionais que são mais próprias à área da Educação.
O modelo da invaginação acompanhado pelo uso das tecnologias da comunicação e informação nas salas de aula (pendrives, datashow, lousas digitais, microfones sem fio, notebooks e variados recursos audiovisuais) na perspectiva do empoderamento das alteridades permanece ainda grande desafio para colaboração da TRANSPARÊNCIA do/no ensinoaprendizado - que ainda, lamentavelmente, permanece propriedade privada da lógica comunicativa opressora unidirecional e de seus semblantes ou cadeias de significação que aprisionam as subjetividades na contemporaneidade.
“Quem foi Calígula?” - pergunta a professora Ivone. Um discente responde: “Tiago Lacerda!” Quem ousaria dizer que sua resposta é incorreta?
Parabéns Aninha, Fernando, Rita e todos os enredados pelo empreendimento!
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