segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Eisenstein e a Psicologia da Arte

RESENHA DE DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

CABRAL, Marcelo Grimm. Eisenstein e a Psicologia da Arte. (2008). 205 páginas. Dissertação de Mestrado - Centro de Filosofia e Ciências Humanas/Programa de Pós-Graduação em Psicologia; orientadora Profª Drª Andrea Vieira Zanella. UFSC, Florianópolis, 2008.




SINTAXE E SEMÂNTICA DAS LINGUAGENS AUDIOVISUAL E CÊNICA NA PERSPECTIVA DE UMA TEORIA PSICOLÓGICA HISTÓRICO-SOCIOCULTURAL DA CRIAÇÃO ARTÍSTICA

A concretização dos esforços acadêmicos de Marcelo Grimm Cabral o conduziram à obtenção do grau de mestre no Programa de Pós-Graduação em Psicologia oferecido pelo Centro de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Santa Catarina com a dissertação intitulada Eisenstein e a Psicolgia da Arte que, merecidamente, deve ser levada ao conhecimento de todos os programas de pós-graduação em Artes Cênicas no Brasil particularmente ao PPGT do CEART da UDESC.


O excelente relatório da pesquisa desenvolvida por Marcelo sob orientação da Profª Drª Andrea Vieira Zanella encontra-se organizado em basicamente três capítulos, ricamente ilustrados, que discutem com rara elegância e notório rigor acadêmico as aproximações entre o pensamento estético de Eisenstein e a concepção vigotskiana da atividade mental ou do psiquismo tipicamente humano na perspectiva da teoria histórico-sociocultural - que foi metaforizada genialmente pelo renomado psicólogo judeu bielo-russo como “reação estética” - exposta em seu polêmico e ainda insuficientemente estudado Psicologia da Arte.

A partir de um resgate histórico das práticas cênicas na Rússia pré e pós-revolucionária a dissertação focaliza de modo privilegiado o engajamento de Serguei Mikhailovich Eisenstein nas experimentações estéticas para a consolidação de um teatro excêntrico. O teatro excêntrico, sabe-se, foi fortemente influenciado pelos princípios biomecânicos da atuação teatral formulados por Meyerhold-Pavlov. Apoiando-se nos estudos de John Kuiper sobre o polêmico intelectual e criador cinematográfico russo Marcelo revela-nos que: “o período do ator excêntrico na Rússia corresponde ao período em que Eisenstein trabalhou no teatro.” (p.57)

A apresentação e o primeiro capítulo da tese consignado Sergei Eisenstein: introduzindo a trajetória de um modernista deve ser leitura indispensável para todos os interessados na história das práticas cênicas de vanguarda do início do século passado e demonstra o cuidado do autor em situar o pensamento de Eisentein na fronteira entre as especificidades das convenções teatrais e audiovisuais no âmbito das implicações políticas, pedagógicas e estéticas de uma teoria psicológica da atividade criadora. Mais do que uma “contextualização” cronotópica do ativismo de Eisenstein o capítulo prepara o leitor para compreender os fundamentos de uma psicologia da atuação teatral na perspectiva da teoria histórico-sociocultural e dos pontos de conexão entre os interesses de Eisenstein e Vigotskii na elucidação dos fundamentos psicológicos da apreciação e da criação artísticas cênica e audiovisual a partir da “psicofisiologia” do ator que serve de sustentação aos sistemas ou “métodos” de interpretação de Stanislavski, Meyerhold-Pavlov.

A dissertação, como o próprio autor adverte, não se propoe “estabelecer uma relação teórica linear entre os dois autores [Eisenstein e Vigotskii], mostrando de que forma se influenciaram, tampouco investigar historiograficamente (...) influências recíprocas” mas é sem dúvida uma relevante contribuição para o entendimento da “confluência entre textos e linguagens artísticas como a literatura, o teatro e o cinema.” (p.13)

O terceiro capítulo intitulado A arte na psicologia e a psicologia na arte: as dimensões estéticas das relações entre forma e conteúdo como problemática psicológica pareceu-me o mais instigante por sinalizar a importância de uma compreensão da sintaxe e semântica das linguagens cênica e audiovisual na perspectiva da teoria histórico-sociocultual do psiquismo. Contata-se ali esforços do acadêmico para uma discussão aprofundada dos fundamentos psicológicos da atividade criadora artística revelando um cuidadoso estudo do texto Psicologia da Arte de Vigotskii e a conexão de suas idéias com a formulação do que Eisenstein denominou “proto-linguagem” ou “monólogo interior” [modalidade híbrida de pensamento verbal e icônico não oralizado] como “matéria prima” da criação cinematográfica.

Embora o texto busque “(re)construir, sob uma perspectiva crítica, um diálogo entre as ideias de Vigotski e o cinema e as teorias cinematográficas de Eisenstein.” (p.13) os argumentos de Marcelo poderiam ir além dos saberes já consolidados sobre o Psicologia da Arte de Liev Semionovich Vigotskii dando voz a este autor quando buscou esclarecer o genuíno objetivo deste estudo:

"Tentei introduzir a aplicação deste método pessoalmente na psicologia consciente [Psicologia das Artes], buscando deduzir as leis da psicologia da arte mediante a análise de uma fábula, um romance e uma tragédia (...) Não estudei as fábulas nem as tragédias e menos ainda uma dada fábula ou uma dada tragédia. Estudei nelas o que constitui a base de toda a arte: a natureza e o mecanismo da reação estética (...) não digo nada sobre a fábula enquanto tal. E o próprio subtítulo: “Análise da reação estética” indica que a finalidade da investigação não consiste na exposição sistemática da doutrina psicológica da arte em todo seu volume e amplitude (...) mas na análise dos processos em sua essência (...) sua importância vai além do que inclui seu campo de observação (...) os princípios que explicam a arte nos falam de uma reação que de fato nunca ocorreu de forma pura, que sempre se produziu com seu “coeficiente de especificação” (...) a reação estética é assim; mas uma outra coisa é encontrar os limites e o significado da própria reação estética dentro da arte"

Cf. VIGOTSKII, L. S. (1996) O Significado histórico da crise da psicologia – uma investigação metodológica (pp. 203-417) In Teoria e Método em Psicologia. São Paulo: Martins Fontes. (pp. 371-372)

Um comentário:

  1. Ricardo,
    segue abaixo o parecer do Conselho Editorial da Revista Urdimento.
    Att,
    Eder Sumariva

    PARECER

    Observo erros de concordância verbal, falta do uso de vírgulas em frases extensas e compostas de várias orações, e pequenos erros de digitação.
    Noto adjetivações e elogios à obra que, sem exemplificação ou argumentação, não esclarecem o leitor.
    Nas citações, o autor substitui o sinal “(...)” por reticências sem parêntesis, o que pode deixar em dúvida se são reticências da obra citada.
    Mas o maior problema, me parece, está na falta de clareza na descrição da obra de referência – o que contraria o propósito de uma resenha. O contraste entre o sintético título da dissertação e o analítico título da resenha sugere o enquadramento que o autor da segunda quis empreender sobre a primeira, como que para corrigi-la e ao mesmo tempo lhe dar o devido destaque. Mas não encontro, no corpo do texto, informação sobre os procedimentos do autor da dissertação: como ele opera sua análise da sintaxe e da semântica da cena teatral e da imagem cinematográfica? De que modo a teoria de Vigotski o auxilia nesta operação?
    Sem estas informações, a resenha necessita da leitura da dissertação para ser compreendida.

    ResponderExcluir