sexta-feira, 18 de novembro de 2011

O BONEQUEIRO VITALINO ( III )

Cresce a animação. Os pregoes se misturam. Entra o cantador, com suas ventoinhas, tamborete e violão.


Mestre Vitalino tocando pífano



Seu José            - Ô GENTE! ÓI SEU MANÉ...

Todos correm até seu Mané, que começa sua cantiga,

Mané                - PRESTA A ATENÇÃO MINHA GENTE, GENTE BOA DA BAHIA... QUE VOU CONTAR UMA HITÓRIA NESTA MINHA POESIA. PODE PARECER MENTIRA, PRA QUEM NÃO ACREDITA EM MISTÉRIO E EM MAGIA... (todos aplaudem e comentam a beleza da cantiga) TUDO ISSO ACONTECEU, É MELHOR NÃO DUVIDAR...SOU CANTADOR RESPEITADO AQUI E EM QUALQUER LUGAR... NÃO SOU HOMEM DE VAIDADE, SOU CANTADOR DE VERDADE, É MELHOR ACREDITAR... (Manifestação de todos) POIS NADA É IMPOSSÍVEL AOS OLHOS DO BOM DEUS, QUE AQUI NESTA TERRA TEM OLHOS IGUAIS AOS SEUS. COMO OS OLHOS DAS CRIANÇAS, CHEIO DE AMOR E BONANÇA, FEITOS À IMAGEM DE DEUS! (muda o dedilhado do violão. Todos levantam-se e seguem para o fundo da cena) FOI EM CARUARU, PERNAMBUCO, ONDE NASCEU VITALINO... UM MESTRE QUE CRESCEU SEM DEIXAR DE SER MENINO, FAZENDO BRINQUEDO DE BARRO DE GENTE E DE ENCANTADOR ESSE ERA O SEU DESTINO... (atores vestem roupas e máscaras de bonecos, no fundo da cena) COM MAGIA NOS DEDO, O SOPRO DE DEUS NAS MÃO... SEUS BONECOS SÃO RETRATOS DO POVO DO MEU SERTÃO, DESDE A FAMÍLIA RETIRANTE (Ator 3, caracterizado de retirante grávida vem até a frente da cena), CORAJOSA E ANDANTE, ATÉ DOUTOR CIRURGIÃO! (Atores 1 e 4 vem até a frente caracterizado de cirurgião e operado)  FEZ BOI MALHADO (Ator 6, caracterizado de boi de bumba, vem até a frente da cena),  ONÇA PINTADA, RETIRANTE PELA ESTRADA, BURRO D’ÁGUA, MONTADOR (Atores 7 e 8 vem até a frente da cena, caracterizados de retirante que puxa um burrico) CANGACEIRO, PADRE CIÇO, ROCEIRO (ator 2 vem até a frente, caracterizado de roceiro), RETRATISTA, ESTUDANTE (ator 5 vem até a frente, caracterizado de boneco estudante) E DENTISTA, PASTORES E CANTADOR. ACONTECEU A MUITO TEMPO, NUMA NOITE DE NATAL, QUE OS BONECOS DE BARRO, EU NUNCA VI  NADA IGUAL... QUANDO A NOITE SE ENCHEU, DE ALEGRE SOM DE SINO, FOI VERDADE, ACONTECEU COM OS BONECOS DE VITALINO... (Cantador vai até fundo da cena, dedilhando o violão)


A cena permanece imóvel por algum tempo. Atores espreguiçam-se, como que acordando de um longo sono.


Quico                - (Saindo da imobilidade) SAI DESSA, SAI MEU POVO... COMO É BOM, COMO É GOSTOSO, PODER CORRER DE NOVO!

Judite                - TU AINDA NÃO SAIU DA TUA CASCA DE OVO E JÁ TÁ TODO VAIDOSO, TODO CONVENCIDO!

Zazinho             - BONECO MAIS ENXERIDO DO QUE ESSE EU NUNCA VI!

José                  - E ONDE É QUE TU PENSA, TU TÁ PENSANDO QUE VAI ?

Gaspar              - JÁ QUER CORRER POR AÍ? ESQUECE QUE É DE BARRO, QUE QUEBRA LOGO QUE CAI?

Zazinho             - SE TU FOR, EU TE AGARRO, ME GRUDO NO SEU RABO, SAIO DESEMBESTADO PRA ESSA TERRA CONHECER!

Samuca             - ÔXE, ÔXE, ÔXE !? VAI PROCURAR QUE FAZER! DEIXA DE MALUQUEIRA, DEIXA DE FALAR BESTEIRA!
Gaspar                      - SE ACOMODE POR AQUI, E NEM PENSAR EM SAIR!

Samuca             - (Pra Maria que continua imóvel) A SENHORA, PEÇO LICENÇA, DÊ LOGO A SUA OPINIÃO, DIGA LOGO O QUE PENSA...

Gaspar              - TU NÃO TÁ VENDO, Ô CABRA, QUE ELA AINDA NÃO PODE FALAR?!

Davi                  - MULHER DE BARRIGA É ASSIM, É TUDO MAIS DEVAGAR...

Samuca             - VIXE, EU NUM TINHA REPARADO QUE ELA AINDA NÃO TINHA MUDADO...

José                  - MAS, VOLTANDO ÀS VACAS FRIAS, VOLTO POR ESSAS VIAS, VOLTO POIS A REPETIR: DAQUI, NINGUÉM VAI SAIR!

Quico                - EU SÓ QUERIA ERA VER... ESSA TERRA EU CONHECER... FICO TRISTE E CANSADO TODO TEMPO PARADO!

Zazinho             - LEVADO DE FEIRA EM FEIRA, ENGOLINDO SÓ POEIRA... E DEPOIS VAI PRUM SALÃO A VIRÁ DECORAÇÃO! SER POR TODOS ELOGIADO...

Quico                - (Todos se movimentam igualmente, com base na fala de Quico) SACUDIDO... ESPANADO... OLHADO E REOLHADO! VIRADO E REVIRADO, SEM DÓ NEM COMPAIXÃO...
Judite                - VOCÊS, POR FAVOR, SE AQUETEM. PAREM DE RECLAMAR... SOMOS BONECOS FAMOSOS: NINGUÉM PODE SE QUEIXAR!

José                  - FALOU, E FALOU BONITO... E POR ISSO EU ATÉ GRITO, COM ORGULHO E VAIDADE, AGRADECENDO A DEUS A SUA BONDADE... A GRAÇA QUE ELE NOS DEU EM PERMITIR, EM DEIXAR, DE PELO MENOS UMA NOITE A GENTE SE TRANSFORMAR...

Judite                - (Faceira) NOS DÁ FALA, MOVIMENTO, PRA TUDO SAIR A CONTENTO E DEUS MENINO LOUVAR!

Gaspar              - EU TAMBÉM ESTOU DE ACORDO. FALO, BRIGO, E ATÉ MORDO QUEM QUISER DISCORDAR!

Maria                - (Transformando-se) ÁI, MEU DEUS, QUE CANSAÇO... SOZINHA, O QUE É QUE EU FAÇO? EM PÉ JÁ NÃO ME AGUENTO...

Samuca             - (Levando o tamborete até ela) TOME, DONA, TOME ASSENTO... PODE SE ADESCANÇAR!

Judite                - E VA FICANDO TRANQUILA, QUE SOZINHA VOCÊ NÃO ESTÁ!

Quico                - SABER DAS HORAS EU QUERIA...

Zazinho             - PRA CONHECER A BAHIA, SE TU FOR, EU TAMBÉM VOU!

José                  - APOIS PODE TIRAR O CAVALINHO DA CHUVA, QUE LIBERDADE EU NÃO DOU! (Puxando a orelha de Zazinho) Ô BONECO RENITENTE, TEIMOSO, METIDO A GENTE! (Os outros meninos saem em defesa de Zazinho) DAQUI NÃO SAI NINGUÉM! E TEM MAIS OUTRO PORÉM... A GENTE TEM QUE ARMAR O PRESÉPIO PARA LOUVAR A JESUS, O DEUS MENINO, PROMESSA QUE FEZ A DEUS, AQUELE QUE NOS CRIOU, O BOM MESTRE VITALINO!

Judite                - OLHA SÓ PRA SEU DOUTOR... VEJA SÓ, QUEM DIRIA... VERSEJANTE POESIA! VAI VIRAR CANTADR, É?!(Gozadora)

José                  - JURO, ATÉ QUERIA MUDAR DE PROFISSÃO... MAS, ARTISTA É TUDO POBRE E RICO É CIRURGIÃO... VOU OS MEUS VEUÇOS FAZENDO, ARREMENDANDO O CANTADOR... MAS AQUI PRA NÓS, SÁ DONA, SEM DEIXAR DE SER DOUTOR... VEUÇO CÁ, VEUÇO ALI, SEM DEIXAR O BISTURI!

Zazinho             -MAS É MELHOR SE PREPARANDO QUE A HORA ESTÁ CHEGANDO!

Maria                -EU VOU LOGO DIZENDO, DEPRESSA ESCLARECENDO: SEJA EM PROSA OU POESIA, SOU EU QUEM VAI FAZER O PAPEL DE MARIA!

Judite                -ERA SÓ O QUE FALTAVA! (Gargalha debochada) MULÉ DEIXE DE INTRIGA, PORQUE EU NUNCA VI NOSSA SENHORA DE BARRIGA!


Todos riem e assoviam.


quinta-feira, 17 de novembro de 2011

O BONEQUEIRO VITALINO ( II )


O primeiro a chegar é Seu José que inicia a arrumação de sua barraca, onde vende bonecos “Vindos diretamente de São Paulo” mas, que na verdade são bonecos artesanais nordestinos. Logo após vem Dona Maria, que após cumprimenta-lo, o ajuda na arrumação e tão logo comece a arrumar suas folhas de pitanga, ouve-se o pregão de...




Gaspar              – (Off) OLHA O PIRULITO, ENROLADO NO PAPEL, ENFIADO NO PALITO, PAPAI EU CHORO, MAMÃE EU GRITO, ME DÁ UM TOSTÃO PREU COMPRAR PIRULITO!

O pregão se aproxima até Gaspar entrar em cena.

Gaspar              - BENÇA DONA MARIA?!

Dna. Maria         - DEUS TE ABENÇOE!

Gaspar              - ÔI, SEU JOSÉ, TUDO BEM?



Seu José            - VIVENDO... QUE NEGÓCIO É ESSE DE TOSTÃO, MENINO? ÓI, ISSO É DO TEMPO QUE SE AMARRAVA CACHORRO COM LINGÜIÇA... MUDA ESSA CANTIGA!

Gaspar              - MAS MINHA MÃE ME ENSINOU ASSIM, QUE MINHA VÓ ENSINOU A ELA...

Seu José            - MAS DO TEMPO DE SUA VÓ PRA CÁ, MUITA COISA MUDOU. MUITA COISA ACONTECEU NESSE MUNDÃO DE MEU DEUS...


Dna. Maria         - SÓ QUE O DINHEIRO MUDOU DE NOME... VOU TE CONTAR! OLHE, MEU BISAVÔ FOI DO TEMPO DA PATACA...

Seu José            - DEPOIS TEVE O REAL, MAIS DE UM REAL SE DIZIA SABE COMO? QUEM SABE? RÉIS GASPAR, SE DIZIA RÉIS...

Dna. Maria         - QUANDO SE QUERIA DIZER QUE UMA COISA NÃO VALIA NADA, MEU AVÔ FALAVA ASSIM: “NÃO VALE NEM DEZ RÉIS DE MEL COADO”!

Seu José            - É, DONA MARIA, MAS ANTES DE TODOS TEVE O CRUZADO...

Dna. Maria         - TEVE CONTO DE RÉIS... ERA DINHEIRO PRA TAPAR CASA!

Seu José            - TEVE CRUZEIRO, CRUZADO DE NOVO, CRUZEIRO NOVO, CRUZEIRO REAL E AGORA, TEM REAL DE NOVO! (Para o público) E O HOMEM TÁ LÁ DEFENDENDO O PLANO DELES!

Dna. Maria         - É, SEU JOSÉ, O HOMEM TÁ LÁ DEFENDENDO O PLANO DELES... ACONTECE QUE O DINHEIRO MUDA DE NOME, MAS DE DONO NÃO MUDA NUNCA!

Gaspar              - ÊTA, COMO É QUE EU CANTO ENTÃO?

Seu José            - QUANTO CUSTA O PURULITO?

Gaspar              - DEZ CENTAVOS!

Seu José            - ENTÃO TEMOS QUE MUDAR O FOLCLORE!

Dna. Maria                 - MUDA, SEU JOSÉ, MUDA... EU VI UM HOMEM DIZENDO NA TELEVISÃO QUE QUEM FAZ ESSE TAL DE FOLCLORE É A GENTE, O POVO!

Gaspar              - ÓI, EU SÓ QUERO SABER COMO É QUE EU CANTO...

Seu José            - ENTÃO CANTA ASSIM...

Os dois cantam.

Gaspar e Seu José      - OLHA O PIRULITO, ENROLADO NO PAPEL, ENFIADO NO PALITO, PAPAI EU CHORO, MAMÃE EU GRITO, ME DÁ UM REAL PREU COMPRAR PIRULITO!
Dna. Maria         - (Que já arrumou suas folhas de pitanga)  COMPRA PITANGA FREGUESINHA! PITANGA PRO PRESÉPIO DO MENINO JESUS... CHEIRO GOSTOSO DE FRUTA GOSTOSA... QUEM VAI QUERER?!

Durante o pregão de Dna. Maria entra Quico.

Quico                - ÔI, GENTE! Ô DONA MARIA, POR QUE É QUE SE ENFEITA A CASA NO NATAL COM FOLHA DE PITANGA?

Dna. Maria         - SEI LÁ... QUEM SABE? DEVE SER BOM... PITANGA É FOLHA SANTA!

Quico                - BOM PRA QUÊ?

Gaspar              - ORA, QUICO, BOM É BOM: NÃO TEM PORQUE NEM PRA QUÊ... E DEPOIS É TÃO CHEIROSA...

Quico                - FLORES, FLORES DE TIA COTA! COMPRA AS FLORES FREGUESA: ENFEITE SUA CASA PRO MENINO JESUS! FLORES! FLORES DE TIA COTA! AS MAIORES ROSAS DO MUNDO! OLHA O GIRASSOL! GIRASSOL FREGUESA!

Zazinho             - (Off) TORRÁ! TORRÁ! TORRÁ DE GUBER, TORRÁ!

Dna. Maria         - ESSE ZAZINHO MERCA ENGRAÇADO... NINGUÉM ENTENDE O QUE ELE DIZ!

Quico                - ÔXENTE DONA MARIA, OS MENINO TUDO ENTENDE... TODO MENINO SABE QUE ELE TÁ VENDENDO AMENDOIM...

Dna. Maria         -AMENDOIM?!

Quico                - SIM SENHORA, (Bem explicado) TORRADO E COBERTO!

Dna. Maria         - EU HEIM?! MENINO TEM CADA UMA

Zazinho             - (Entrando. Ninguém entende nada, pois Zazinho traz é algodão doce) DU... IN... TORRÁ! TORRÁ!
TORRÁ DI GUBER, TORRÁ!

Seu José            - QUAL A SUA BALTAZAR, VEM VENDENDO ALGODÃO DOCE E MERCA AMENDOIM TORRADO E COBERTO?!

Dna. Maria         - DEVE SER O COSTUME, NÃO É ZAZINHO?!

Zazinho             - QUE NADA... É SABEDORIA MERMO! EU MERCO AMENDOIM, JÁ TENHO MINHA FREGUESIA CERTA, NÉ? AÍ, OS MENINO VEM PRA COMPRAR OS AMENDOIM... NÃO TEM. COMO ELES GOSTA DE MIM, COMPRA O QUE EU VENDER...

Gaspar              - E POR QUE TU MUDOU MERCADORIA HOJE?

Zazinho             - MUDÁ, NÃO MUDEI NÃO... É QUE HOJE TEM MUITO MENINO NA RUA! MUITO ANTES DE EU CHEGAR AQUI, JÁ TINHA VENDIDO OS AMENDOIM TUDO. AÍ, O HOME DO ALGODÃO DOCE ME PEDIU PRA VENDER PRA ELE... É BONITO NÃO É? PARECE ÁRVORE DE CARTÃO QUE A GENTE VÊ NAS LOJA... TODA COLORIDA TODA FEITA DE NÚVI!

Seu José            - AQUILO NÃO É NUVEM, MENINO: AQUILO É NEVE!

Zazinho             - MAS PRA MIM É NÚVI... QUE OS ANJO TROUXERAM PRA TERRA PRA FICAR TUDO MACIO PRA ELE NASCER...

Entra Davi.

Davi                  - OLHA A LARANJA DO CABULA! UMA VERDE, OUTRA MADURA. QUEM NÃO PODE NÃO ENGULA... OLHA A LARANJA! LANJA, LIMA, LIMÃO! TAN... GIRINA!

Judite                - (Vem quase o mesmo tempo que Davi. Enquanto ele merca, ela arruma seu tabuleiro com fazendas,
                         Rendas, colchas de retalho etc) BELEZA! BELEZA DO
                         CEARÁ! TUDO FÊTCHO A MÃO... RIQUEZA,FREGUESA! BARATINHO... NÃO PAGA O LUXO DA CASA. COMPRE AQUI E PODE DIZER QUE COMPROU NAS BUTIQUE... NÃO TEM PROBLEMA. OLHA A TOALHA DE MESA PARA SUA CEIA DE NATAL... QUEM VAI QUERER?

Samuca             - (Chegando enquanto ela merca, quase escondido atrás dos seus capins coloridos. Vem com grande alegria e algazarra) CHEGUEI! CHEGUEI EU, MINHA GENTE! OLHA OS CAPIM PRA CAMA DO MENINO NASCER... CAPIM COLORIDO. CAPIM A CORES! DOURADO E PRATEADO... CAPIM DE OURO E PRATA... COMPRA BRANCA, COMPRA PRETA, COMPRA MULATA! OLHA O CAPIM!


Seu José            - BONECOS! BONECAS E BRINQUEDOS! DIRETAMENTE DA FABRICA DE SÃO PAULO PRAS CRIANÇAS DA BAHIA. 3 POR 10! É BARATO FREGUESA... É BARATO. O PATRÃO FICOU MALUCO, MANDOU VENDER TUDO SEM LUCRO... É PRESENTE, PRESENTE DE NATAL... É PRA ACABAR... É AQUI MESMO! DÊ ALEGRIA A SEU FILHO NA NOITE DE NATAL... A SUA BONECA MERECE UMA BONECA! VAMOS MINHA GENTE! É AQUI MESMO...

Cresce a animação. Os pregoes se misturam. Entra o cantador, com suas ventoinhas, tamborete e violão.

105º aniversário do nascimento de L. S. Vigotskii


HÁ 105 ANOS ATRÁS NASCIA VIGOSTKII

17 DE NOVEMBRO
CENTÉSIMO QUINTO ANIVERSÁRIO DO NASCIMENTO DE VIGOTSKII





                               Liev Semionovich Vigotskii 1896 – 1934


                          

A imaginação é um processo psicológico novo para a criança; representa uma forma especificamente humana de atividade consciente, não está presente na consciência de crianças muito pequenas e está totalmente ausente em animais.”  [1]  (Destaques meus)

"O brinquedo [faz-de-conta] fornece ampla estrutura básica para mudanças das necessidades e da consciência. A ação na esfera imaginativa, numa situação imaginária, a criação das intenções voluntárias e a formação dos planos da vida real e motivações volitivas - tudo aparece no brinquedo [faz-de-conta], que se constitui, assim, no mais alto nível de desenvolvimento pré-escolar. A criança desenvolve-se, essencialmente, através da atividade de brinquedo [faz-de-conta]." [2]  (Destaques meus)

O nivelamento e a correção do desenho infantil  [e da expressão artística infantil em geral] significam apenas uma grosseira interferência na estrutura psicológica da sua vivência e ameaça servir como obstáculo a tal vivência. (...) Por isso a plena liberdade da criação infantil, a renúncia à tendência a equipará-lo [o psiquismo infantil] à consciência do adulto e o reconhecimento de sua originalidade, das sua peculiaridades, constituem as exigências básicas da psicologia.”  (Destaques meus) [3]

“O único educador capaz de formar novas reações no organismo é a própria experiência... A rigor,,do ponto de vista científico, não se pode educar a outrem [diretamente]. Não é possível exercer uma influência direta e produzir mudanças em um organismo alheio, só é possível educar a si mesmo, isto é, modificar as reações inatas através da experiência... a criança educa a si mesma... o critério psicológico exige que se reconheça que, no processo educativo, a experiência pessoal do aluno é tudo. A educação deve ser organizada de tal modo que não se eduque ao aluno, mas que este se eduque a si mesmo... Na base do processo educativo deve estar a atividade pessoal do aluno, e toda a arte do educador deve restringir-se a orientar e regular esta atividade... Chegamos, assim, à fórmula do processo educativo. A educação é realizada através da própria experiência do aluno, que é totalmente determinada pelo ambiente; a função do professor se reduz à organização e à regulação de tal ambiente... A meta da educação não é a adaptação ao ambiente já existente, que pode ser efetuada pela própria vida, mas a criação de um ser humano que olhe para além do seu meio... Não concordamos com o fato de deixar o processo educativo nas mãos das forças espontâneas da vida...No processo de educação e com esta nova concepção, a importância do professor é incomensuravelmente maior. Ainda que seu papel aparentemente dimunua quanto à sua atividade externa, pois passa a ensinar menos... O poder desse professor sobre o processo educativo é muito maior que o poder do professor de outrora... O professor desempenha um papel ativo no processo de educação: modelar, cortar, dividir e entalhar os elementos do meio para que este realizem o objetivo buscado. O processo educativo, portanto, é trilateralmente ativo: o aluno, o professor e o meio existente entre eles são ativos.” (Destaques meus) [4]


Ricardo Japiassu



A capacidade de combinar o “antigo” com o “novo” fornece as condições necessárias para a atividade criadora. Vigotskii considera que a imaginação nutre-se de materiais tomados da experiência vivida pela pessoa. É com base nisso que ele postula a principal lei à qual se subordina a “função imaginativa”: quanto mais rica for a experiência humana, maior será o material colocado à disposição da imaginação.[5] Desta lei resulta o compromisso pedagógico das intervenções educativas para com a de ampliação da experiência cultural das pessoas – se o objetivo for mesmo oportunizar uma experiência “rica” para que elas sejam capazes de se desenvolverem plenamente como seres humanos e fortalecerem sua capacidade criadora-inovadora-empreendedora.


[1]  VYGOTSKY, L. S. (1996).  A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, p.122.
[2] VYGOTSKY, L. S. (1996). A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1994, p. 135.
[3] VYGOTSKY, L. S. (2001). Psicologia pedagógica. São Paulo: Martins Fontes, p. 346.
[4] VIGOTSKI, L. S. (2003) Psicologia Pedagógica – Edição comentada por Guilhermo Blanck. Porto Alegre: Artmed, pp. 75-79.
[5] VYGOTSKY, L. S. (1982) La imaginación e el arte em la infancia – ensayo psicológico. Madrid: Akal, p. 17.